“Meu Deus! É ela!!!” – De cara com meu ídolo

Dei de cara com meu ídolo! E agora? O que fazer? Aquela figura que vejo há anos, na TV, no Youtube, nas redes sociais, na mídia, na boca dos outros está aqui, bem diante dos meus olhos!

Passei por esse momento, “de cara com meu ídolo”, algumas vezes na vida… Com a Dina (a “Rainha da Dança do Ventre no Egito”, há 30 anos, no Trono), por exemplo, foi assim: Havia me preparado para esse grande encontro e ensaiado tudo, bonitinho, em árabe… No meu ensaio imaginário, eu ultrapassava um mar de “Cortesãs”, me aproximava dela e dizia, em árabe decoradinho “Muito obrigada, seja bem-vida ao Brasil, eu te amo, você é linda, eu sou bailarina por sua causa!”. Mas, na realidade, ela se sentou ao meu lado, vinda sei lá de onde, e me pediu um isqueiro… Sem pompa, sem corte, sem frescura e eu fiquei olhando pra cara dela, com uma cara pasmada, respondendo a tudo, monossilabicamente… Teve o Edu Lobo (comprei roupa pra encontrá-lo! À época, iria trabalhar, como assistente, na restauração de uma de suas maiores obras, “O Grande Circo Místico”, no qual tive a sorte de participar… ). No ensaio, ele chegava e eu o recebia, sorridente, à porta, e dizia “Maestro, muito obrigada, é uma honra enorme trabalhar com o Senhor!”, mas, quando cheguei no Estúdio ele já estava lá e eu, ao notá-lo, tive um ataque de riso e foi bem ridículo… Saí correndo, me recompus e voltei, com cara de bunda, de novo… Depois teve o Djavan… Um amigo comum nos apresentou (depois de seu Show, num jantar) e – nesse caso, não havia ensaiado nada, foi uma surpresa – quando meu amigo disse “Djavan, essa é a Jade!” Ele abriu um sorriso enorme e veio em minha direção cantarolando “Jade” do João Bosco (tem que ser muito estrela – de verdade! – pra ter uma generosidade destas, né?) e eu, somente, sorri. Muda como uma flor. Passei por outras situações assim (no Egito, com grandes Estrelas da Dança do Ventre e, no Brasil, diante de Feras da MPB) e percebi que, quanto maior a Estrela, mais gentil e generosa ela é e é nelas que me inspiro, quando sou eu a “tal da Estrela”. (“Enxergo longe porque me apóio nos ombros de Gigantes!” Não me lembro quem disse isso, quisera tivesse sido eu, porque esta máxima é um dos “faróis” que sigo em minha carreira!).

Circulando pelo “Olimpo” (tive muita sorte na vida, nesse sentido, e cruzei pessoas que jamais sonhei conhecer pessoalmente) sempre achei muito admirável e elegante a postura desses “Monstros” e percebi, ainda, que uma das maiores torturas para a alma humana é ser a ela delegada uma “Média autoridade”. A Média autoridade é uma coisa que gera na pessoa uma histeria e ela precisa provar o tempo todo, para quem está “abaixo”, que ela, sim, está acima e para quem está “acima” que ela, sim, está a caminho. É um sofrimento enorme!

No Microcosmo onde transito (a Dança do Ventre) há 25 anos, num Mercado que existe há 30 (no máximo!) sou, sim, uma espécie de “Djavan” (mal comparando, claro, ao Macrocosmo que é a MPB no Brasil) e todo mundo me conhece (ama, odeia, despreza, sei lá, mas, que conhece, conhece!) e, inspirada no comportamento dos meus ídolos (“me apoiando no ombro de gigantes”) nunca me dei o direito de desfilar com cara de “Ai, que dura, a minha vida de estrela!”, aquela cara de mulher de marido rico, desfilando no Shopping, puta da cara com o tédio de sua vida maravilhosa, sabe? Acho isso um horror, um nojo… Mas… (sempre tem um tal de um “mas”!) Essa postura mais aberta dá um certo trabalho…

Na semana passada, li sei lá onde “Bondade é como blush, se você usar demais, vão achar que você é palhaça!” e expandiria o “Bondade”: Pode ser “simplicidade”, “simpatia” ou, até, a simples e vulgar “boa educação”, porque a Nobreza é um Idioma e, às vezes, você agir com Nobreza com uma pessoa que não fala “nobrez” dá bem errado e eu tenho o trabalho de explicar ao interlocutor (fã, figura que pede pra tirar uma foto ou começa uma conversa qualquer) que eu não sou uma “coisa que pertence a todos” por ser “famosa”. Algumas pessoas que consideram a mim e a elas mesmo como sendo “VIP”, imediatamente, consideram-se “íntimas” e outras, que não se acham nada VIP, tendo um acesso, uma proximidade comigo (ou com qualquer artista), às vezes, não sabem bem o que dizer ou fazer num contato “olhos nos olhos” e toda a sorte de esquisitices começa a acontecer…

Certa vez, quando eu usava meus cabelos naturais (que são crespos, bem crespos, armados) estava do lado de fora do Teatro, depois do Show (cumprimentando pessoas, agradecendo elogios, fazendo fotos, essas coisas) uma mulher de cabelos longos e lisos (belíssimos cabelos, diga-se de passagem) aproximou-se e disse (assim, sem prefácio) “Jade, quer meu cabelo emprestado pra você dançar?.. Todas as bailarinas dizem que têm inveja do meu cabelo!”… Sim… aconteceu… Outra boa… A mulher se aproximou, elogiou, elogiou e, ao final, disse “Eu faço aula de Dança do Ventre, mas não quero ser bailarina, não, porque dá muito trabalho, tem que pôr silicone, malhar, etc, e eu gosto de mim do jeito que eu sou!”. Nessas situações eu dou um jeito de sair correndo, às vezes, literalmente, mesmo, simplesmente, saio, porque não há o que dizer, mesmo…

Tem, também, o modelo “Omeumarido…”, tem “Agarra o meu marido!”, tem “Meu marido ficou de p… duro te vendo dançar!” (juro por Deus! Essa é bem comum!), tem “Meu marido não quer que eu faça aula com você porque é muito sensual” ou “Meu marido quer que eu faça aula com você!”, e um sem fim de coisas que começam com “Meu marido”… Na hora da foto, “Pode agarrar que eu deixo! É meu marido!”. Nessas situações, normalmente, eu e o “meumarido” ficamos sem jeito e eu sinto muita pena dele porque eu vou sair andando, mas ele não… Afinal, é o marido dela, uma coisa dela, um bem que a ela pertence.

Tem o pessoal que “trabalha com Seguros de Saúde” (só pode ser!) que quer saber meu nome de registro, quantos anos tenho, onde moro, se tenho filhos, tem também o pessoal do Raio X, que quer saber o que é ou não “natural” no meu corpo, tem ainda algumas “mães de plantão”  que dizem “Ah, mas você não tem filhos, né?” (nesse caso, a cara é ótima, é uma coisa “ahá! é por isso!”) e o pessoal do “Ah, bom!”, do tipo “É silicone, né?… Ah, bom!” ou “Você não tem filhos, né?.. Ah, bom!”.

Tenho unhas enormes, naturais e tem as que perguntam “Mas, essa unha não é sua, né?” e quando eu digo que sim, agarram minha mão para uma investigação mais “apurada”. Tem outra bem intrigante, que é a mulherada que quer dar uma “apalpadinha”… Algumas pedem “Posso pegar no seu peito?”, outras, simplesmente, pegam… No meu peito, no meu cabelo… Outro dia, levei uma “encoxada” (juro!) e, como acontece, quando fico muito nervosa, tive um ataque de riso… Ela chegou e disse “Me dá vontade de te encoxar!” e, simplesmente, me deu um “junta”, diante de uma fila de pessoas que aguardavam para fazer uma foto. Pensei se o pessoal da fila não iria querer mudar a ordem da fila e vir “por trás” mas, graças a Deus, uns riram, outros fingiram não ver e houve uns que, de pura vergonha alheia, se retiraram…

E tem, também, um outro grupo que é aquele que chega no Djavan (vou usar o Djavan porque, essa analogia com meu próprio nome seria “anti-ético” da minha parte) e diz: “Eu amo o seu trabalho, eu acompanho o seu trabalho desde 1982, fui a vários shows seus, fiz um Workshop seu em Seilaond, seilaquando…” e, daí em diante, envereda para vários caminhos…. alguns são: “se não sou eu, sei lá o que seria da sua carreira!”, “não acredito que você não lembra de mim!”, “todo mundo acha meu trabalho igualzinho o seu” ou (acho que esse é o pior!) “Você e o Frank Aguiar são os melhores cantores do Brasil, na minha opinião!” (Sorry, Frank… sorry fãs do Frank, mas compará-lo com o Djavan é meio demais…) e tem alguns (esse, acho até bonitinho, apesar de não ser a melhor coisa de se ouvir) que são fãs “saudosistas” que amam o trabalho que o Djavan fez em 1973 e dizem coisas do tipo “Eu ainda gosto de você, mas em 73…”.

Tem os “místicos” que vêem coisas enquanto eu danço, como Entidades, Espíritos (às vezes “do bem”, às vezes “do mal”), reencarnações de pessoas famosas ou antigos Deuses do Egito, evangélicos com informações de última hora, como “Jesus te ama”, análises e previsões para o meu futuro, pessoas que pedem para ler minha mão, astrólogos que, quando digo “É Touro!”, fazem uma cara de “Ah… claro que é Touro!” e saem falando tudo o que isso significa, tem os “Fiscais da Saúde” que querem saber (e aconselhar sobre!) o que eu como, tem Vegetarianos desapontados “Não acredito que você come cadáveres!”, anti-tabagistas “Ai, Jade… Que decepção! Você fuma?!” e sapecam “A” informação que faltava para eu largar o cigarro: “Isso faz mal!”.

Em tempos em que todo mundo tem uma câmera na mão, o trabalho de nós, artistas, aumentou (demais!) e tem, sempre, uma longa série de fotos (antes, depois e às vezes, durante minha apresentação). Temos um probleminha linguístico… “Selfie” é uma coisa, significa “fotografar-se a si mesmo”, mas virou um apelido para “close, feito por mim mesma, com a câmera virada pra mim, mais sei lá quens ao lado, fazendo alguma palhaçada”, então, a pessoa te pára, pede pra alguém fazer a foto e, depois, “Agora, vamos fazer um selfie!” e, muitas vezes, te pede pra fazer biquinho, careta ou sei lá o quê. Isso tudo, às vezes, suada, cansada, com fome, depois de um vôo longo, antecedido de uma noite mal dormida, a ida, às vezes, antes do nascer do Sol, para o Aeroporto, dar tudo certo com o tal do vôo, chegar ao destino e tudo pode acontecer nessa chegada… tem gente que quer te mostrar a cidade, levar pra conhecer a sua Academia, apresentar para a mãe, mostrar a casa onde cresceu, etc., quando tudo o que preciso é ir para o Hotel, descansar minimamente e me preparar para o Show. Às vezes, esse momento das fotos acontece quando faz 20 horas que eu não durmo ou não como ou ambos.

Encaro a “sessão de fotos” como parte do meu trabalho. Como maquiar, arrumar o cabelo, me alongar é, simplesmente, uma coisa que “tenho que fazer”. Dia desses, num show, após dançar, morrendo de fome, pedi que me servissem alguma coisa na cozinha, ao invés do local onde estavam os convidados, para que eu pudesse comer com algum sossego e privacidade. Comeria rapidinho e já sairia para as fotos e uma moça que descobriu meu “paradeiro”, entrou na cozinha e disse “Jade, eu tenho que ir embora! Precisamos fazer a foto agora!” e eu respondi “Cinco minutos, amor… Já vou lá pra fora!”. Ela ficou ali, parada, me olhando comer, com uma cara de “Vai logo que eu tenho mais o que fazer!” e, cansada de me esperar, disse “Ah, sinto muito, mas vai mastigando, mesmo!” e me abraçou, sentada, com a boca cheia, com seu celular na mão, câmera virada para nós… Eu tive que fazer alguma coisa, disse “Peraí… eu já vou sair e a gente faz a foto!” e ela ficou muito brava, foi embora com sua câmera, me olhando muito feio… Essa mesma moça já havia perguntado minha idade num outro momento… Tem também a que finge estar tirando foto de si mesma, me focando ao fundo, às vezes, com o figurino pela metade ou me alongando ou, ainda, sem roupa… (sim… acontece…).

Tem, ainda, o pessoal que acredita que eu seja a “Porta da Esperança” e me pede toda a sorte de coisas… Emprego, emprego no Egito, marido árabe, aula ou show ou ambos (de graça), roupas (há quem escolha a roupa que quer que eu dê!), traduções de músicas, feedback de vídeos, contatos em outros Países, passar em meu estúdio pra “bater um papo”, conselhos sobre assuntos diversos, sem nenhuma conexão com meu trabalho (o “top” dessa lista foi uma aluna que, numa uma aula particular, decidiu dividir comigo o fato de ter atração sexual pelo próprio filho! Juro que isso aconteceu… ), aconselhamentos médicos (o que fazer com dores na lombar, menopausa, cirurgias) e “uma mãozinha” em Concursos onde farei parte do Juri. Permutas “Você dança no meu Evento de graça e eu danço no seu” (esse vem de pessoas que, nem me pagando, eu escalaria em uma Produção minha) e tem jeitos bem bizarros de pedir essas coisas, às vezes, num tom “Que bom que te encontrei aqui! Só você poderá me ajudar!” ou ainda “Estou te dando a honra de trabalhar pra mim de graça, pois isso será a mãozinha que faltava para sua carreira” e, esse é ótimo, o “Você TEM que me ajudar! SÓ VOCÊ poderá me ajudar!”. É doido, doido demais!

Nesses tropeços com fãs, também vivi momentos de profunda delicadeza e beleza, recebi presentes, às vezes, de pessoas que escolheram coisas em seus próprios guarda-roupas, fotos antigas comigo, cartas, flores, lágrimas de amor sincero, elogios que dá vontade de contar pra todo mundo, chiliques emocionados de fãs, pessoas que choram, que se arrepiam, que me olham com um amor que me sinto obrigada a ser “melhor que eu mesma” para merecê-lo e, em nome desses momentos deliciosos, “encaro as doidas” porque, amarrar a cara me livraria de malucas, sem noção ou sem educação, mas também me privaria  da delícia de conhecer pessoas muito lindas e dar a elas um “sonhado abraço’ meu.. Já recebi declarações de amor, homenagens e agradecimentos, em muitos formatos, alguns de uma singeleza comovente como comidinhas, cartinhas, desenhos feitos por crianças, pessoas que batizaram bichos com meu nome e, muitas vezes, estas coisas complementam o meu cachê, às vezes, vêm depois de trabalhos onde não havia uma cadeira ou um copo d’água no camarim, às vezes, não havia, sequer, um camarim, hotéis horríveis, comida ruim e volto pra casa, ainda cansada, com o corpo dolorido e venho, no avião, revendo estes momentos e pensando que minha carreira vale a pena…

Quase sempre, a educação, a discrição e o bom gosto andam juntas, o contrário também, então, pessoas que não têm nada a dizer, são as que mais falam, mas em todo monte de areia, há grãos de ouro, em todo o monte de gente, há pessoas, em todo o monte de nada, há seres recheados de amor e é nestes seres que eu foco, esperançosa, cada vez que uma voz que não conheço diz “Jade”, com aquele sorrisinho sem jeito, de quem me conhece, sem me conhecer. Pelo sim, pelo não, atendo, sempre, sorrio sempre, faço as fotos, os “selfies”, autografo as coisas, porque esse amor que algumas pessoas sentem por mim, ainda que seja, somente, pela minha personagem, vale o risco de ouvir algumas bobagens e estas bobagens viram “histórias pra contar no Bar”, enquanto declarações de amor gratuito ficam tatuadas para sempre, na camada mais profunda e macia da minha alma!