Nosso Mercado e Nossa auto-estima

Esse é daqueles textos que escrevo sem a certeza de que aquele que lê, de fato, compreende o que quero dizer… Não é uma questão de subestimar a capacidade de interpretação das pessoas, no mínimo, não somente isso, mas é um texto que toca numa ferida muito profunda da nossa Cultura, daquelas que muita gente se recusa a ver… Aqueles que “não admitem que há racismo/machismo/nazismo no Brasil” não irão, de jeito nenhum, “tolerar esse texto”. Mas… a Situação pede e talvez seja eu, mesmo, a pessoa a tocar em mais essa ferida que é a baixíssima auto-estima do Brasileiro, de um modo geral, e a necessidade de consumir qualquer coisa, contanto que seja “Maide in Seilaonde”, contanto que não seja nossa…

Vou começar pela “Escova Progressiva” que foi desenvolvida aqui no Brasil, mais exatamente, no Rio de Janeiro, onde cabeleireiros do Mundo inteiro se ocuparam em visitar para aprender a técnica que é vendida mundo afora como “Alisamento brasileiro” e, aqui no Brasil, os nomes “Escova Francesa”, “Escova Marroquina” foram o que fizeram o “negócio engrenar”.

Acabo de voltar do Egito e, como em todas as vezes que visitei o Egito, fui ver a Soraia (Zayed, brasileira, brasileiríssima, trabalhando no Cairo há 15 anos) e, mais uma vez, constatei que é (sem nenhuma possibilidade de comparação!) o quadril mais “ágil” da história da Dança do Ventre. Pode “não gostar”? Acho que sim… Pode não gostar de chocolate, também, agora, dizer “que não é bom”? Acho que não… O que faz da Arte, Arte de fato, entre outras coisas é o Artista ter-se inventado e reinventado, assinado claramente seu trabalho e influenciado o meio por onde circula! Tem “Mestres Egípcios” que sequer conhecem a Soraia (ou admitem conhecer, sei lá) que ensinam “Coisas de Soraia” em suas aulas e é possível ver essas “coisas de Soraia” em corpos que jamais tiveram contato com ela, pessoalmente, porque ela faz parte da História da Dança do Ventre Moderna, parte das transformações dessa história e influenciou, ainda sem querer, ainda sem “ser amada por todos” a Dança do Ventre, como um todo. Tenho a nítida impressão de ser a única pessoa no Brasil (sim, fora do Brasil, muita gente sabe disso!) a ter constatado isso…

No final do Ramadan, vem “O Feriadão do Mundo Árabe” que é “Eid”. Essa é uma época de celebração, de “recompensa” pelo mês de Jejum (entre outras “limitações” impostas aos Muçulmanos) e é hora de “deitar o cabelo”. O Egito é e sempre foi o “lugar ideal de deitar o cabelo”! Tem festa, cabarés, Dança do Ventre, arguille, o Egito não dorme, o Egito é “Laico” (entre aspas, mas é!) o que significa que até mesmo uma “pecaminosa cervejinha” pode ser encontrada em toda parte! Assim, a Arábia Saudita “desce toda pro Cairo” pra aproveitar. Esse ano, vi grupos de mulheres sauditas (sem a “proteção de seus homens” é, o Mundo mudou!) em cabarés… Com essa presença maciça deles, o cabaré fica “Todo Khalige” (toca músicas do Khalige, pessoas dançam danças do Khalige) e vi mulheres (algumas bem cobertas para o ambiente, outras, penduraram seus “hijabs” no Toillet e saem de shorts curtos, minissaias) livres, celebrando sua vida, uma coisa muito linda de se ver. Inspirada nessa alegria, nessa liberdade “de curto prazo”, me reapaixonei pelo Khalige e voltei para o Brasil muito a fim de estudar, preparando um número e figurino para meu próximo trabalho aqui, com aquele “delicioso friozinho na barriga” do desafio, da coisa nova, do desejo de ser aprovada (sim, claro que tenho, como todo mundo, especialmente, apresentando coisas fora da minha “região de conforto”). Fui, Youtube adentro, em busca de inspirações…

Vi muita “Baixaria” (mulheres se esfregando no chão, umas nas outras, algumas coisas de gosto bem duvidoso, no intuito óbvio da “sedução escrachada”, coisas dispensáveis para os olhos de uma mulher, de um modo geral), continuei minha busca… Poucas mulheres árabes, especialmente, “nos anos 2000” e, com a palavra chave “Khalije” ou “Khalige” cheguei na Warda Maravilha (brasileira, brasileiríssima) e posso dizer aqui, sem medo de errar: A melhor bailarina de Khalige de todas… Não só a melhor como, na verdade a única que, pros meus olhos, “entendeu esse negócio que vi no Egito”, essa “liberdade volátil”, essa “celebração sem pano preto cobrindo o rosto”, das mulheres sauditas… É bonito, é forte e delicado, tem uma sensualidade “cuidadosa”, uma coisa bem especial e, principalmente, uma energia totalmente diferente da Dança Oriental ou Dança do Ventre Clássica… Outra coisa, de outro povo… Um povo com o qual a Warda tem convivido por (acho que) uns 20 anos. Uma coisa que só ela “pegou”.

Minha apresentação no Egito é, sempre, uma certa “dor de cabeça” pra mim… Tenho que estar no meu melhor (melhoríssimo!) modo, apresentar alguma coisa que seja “eu, com certeza”, na frente dos maiores mestres de Dança do Ventre do Mundo (já dancei pro Mahmoud Reda, Nagwa Fouad, Mona Saiid, Raqia Hassan, Farida Fahmi, Dina, Randa, Tito, Yusri Sharif, somente pra citar alguns) é uma coisa que faço com o coração na mão (e, porque não dizê-lo, com um figurino de 4 dígitos, 4 “dígitos-dólar”, quero dizer) e, claro que a presença de olhos familiares na platéia deixa tudo mais gostoso! Juntos, os que “me testam” e os que “me adoram”, formam um grupo bem delícia de me apresentar. São “dois desafios em um” porque agradar fãs, não necessariamente é uma coisa fácil. O fã tem a “sua Jade” e não tolera menos do que a “Jade que traz para o Show em sua memória e em seu coração” é aquele público que pode “não gostar dessa vez” pode “gostar do que você fazia antes”, é uma presença importante pra mim, pra que eu não corra o risco de “me perder”.

O que aconteceu no Egito esse ano foi um tanto pior do que nos anos anteriores, quando boa parte dos brasileiros que estavam no Cairo, estavam ocupados com passeios e não puderam me ver. Esse ano não havia UM ÚNICO BRASILEIRO na platéia no dia do meu Show. Além da divulgação oficial do Festival, fiz também, uma divulgação minha, em bom português, com o dia e horário do show e da minha aula. A “gringaiada” que não estava atenta às divulgações, foi me parando no Festival pra perguntar “quando você vai dançar?” e estavam todos lá. Algumas brasileiras me disseram outra coisa (isso, nos 5 anos que dou aula no Egito!) “Jade, queria tanto ver seu show/ir à sua aula, mas, infelizmente, não vai dar porque vou seilapraonde”. Nenhum olhar familiar, nenhum aplauso “em português”, nenhuma foto comigo e meu figurino de deixapralá quantos dólares…

No dia seguinte, foi minha aula… Duas brasileiras no grupo. Uma excelente bailarina em ascensão no Mercado brasileiro e, pra minha sorte, minha aluna aqui de São Paulo (a Bruna Nasif, a saber) e a bela Jéssica, que pegou segundo lugar no Concurso Profissional no Festival que vive e trabalha (muito bem, obrigada)  em Paris.

Da parte dos “Mestres” o que ouvi foi que “não há o que dizer ou ensinar ou somar ao meu trabalho”. O respeito que a Randa Kamel tem pelo meu trabalho é suficientemente provado pelo fato de ela me convidar para trabalhar com ela (não sei se alguém “reparou” mas eu não organizo grupos para ir para Festivais no Egito! Estou no meu segundo Festival e, em ambos, fui convidada pele qualidade do meu trabalho). A Mona Said que é, junto com a Fifi Abdo, minha “primeira professora” me “aprovou” em 2006 (há dez anos). Essa aprovação de meus mestres, mais “a fama internacional”, mais eu estar “aqui” há 25 anos, mais o fato de que, de cada 10 bailarinas incríveis no Brasil, 8, 9 passaram, ou ainda passam, pelo “meu espelho” me dão segurança (só faltava não ter nem isso, né?) de que meu trabalho é bom sim e muito bom.

Então, chego a conclusão que o “Problema” que tenho, na opinião do Mercado de Dança do Ventre do Brasil é o mesmo da Soraia e da Warda: nasci aqui. E o que quer que tenha sido “made in Brasil” não é, mesmo, grande coisa… Bailarinas estrangeiras que pedem pra tirar foto comigo, que fazem ou fizeram aula comigo fora do Brasil já foram convidadas para trabalhar aqui em condições que jamais foram ou serão oferecidas para mim (ou pras minhas contemporâneas, Soraia e Warda) entre estas “convidadas”, inclusive, meninas que tem menos tempo de vida do que nós três, de experiência profissional na Dança do Ventre.

A Soraia e a Warda saíram fora… Estão lá do outro lado do mundo, ralando, “concorrendo” com meninas que têm metade da sua idade e um “passaporte árabe”… Tenho muito orgulho delas! Somente elas sabem, na real, o “preço” (altíssimo!) de passar uma vida inteira longe de casa, “encarando o Mundo Árabe”, são guerreiras, são vencedoras, são meninas que mancharam muitos travesseiros de delineador negro em noites solitárias, com o corpo quebrado, sem uma mãezinha por perto. São mulheres que aplaudo de pé!

Eu insisti no Brasil. Eu fiquei. Eu recusei todos os convites. Eu “acreditei na gente” e, sinceramente, somente agora, pela primeira vez, tantos anos depois, todas as “coisas realizáveis” realizadas, tendo vivido coisas que jamais ousei sonhar (como dar aula no Egito, por exemplo) sinto uma ponta de arrependimento por isso… Não me sinto “recompensada” à altura da minha entrega por essa Dança que tanto amamos.

E esse é um texto “urgente”, uma questão que toca a todas nós, envolvidas com Dança do Ventre, dançando, aprendendo, ensinando, contratando bailarinas e, ao mesmo tempo, muito pessoal e, sim, admito, muito, muito magoado… Meu orgulho desaprova a publicação desse texto, mas a verdade que aperta meu coração, mais uma vez, é maior que meu orgulho, é maior que o risco de “magoar possíveis contratantes” e, por mais uma razão, não ser a “bailarina convidada”… Estou na minha casa e esse é o preço mínimo que exijo como “recompensa”: O que quer que aperte meu coração, ainda que ninguém ouse dizer, eu estarei aqui para dizê-lo em bom português, caso contrário, nada terá valido a pena…

O vô Lídio, o Bola e o Cachaço

Lídio. De acordo com a Wikipédia, O modo lídio forma-se estabelecendo como tônica a quarta nota da escala diatônica, podendo ser classificado como um modo maior. Entendeu? É um modo. Ponto.
E também é o nome do meu avô, que faleceu no dia 1 de abril passado (bem humorado o vô Lídio!). O vô Lídio era louro, de olhos muito azuis, alto, muito alto, devia ter uns 3 metros. Com o passar dos anos ele foi diminuindo como tudo que conheci no Paraná, diminuiu! Eu brincava de montar em melancias e demorei um tempão, até que meu irmão mais velho me informou: “Não! As melancias do Paraná não são gigantes! Você era bebê quando montava nelas!” o que me deu uma certa frustração.

Eu achava que Lídio era um modo Menor… Talvez porque o tom que falava meu avô parecia “meio menor”, além do fato dele falar uma língua própria que somente minha avó entendia.

Ele não era, originalmente, meu avô! Ele era um “homi alto do zóio azul” que roubou minha avó do meu avô original. Um cearense me disse, certa vez, que as baianas são assim, mesmo: “É minha filha… baiana é assim… um belo dia ela pega uns panos de bunda e dá no pé!” disse o taxista (abandonado por uma baiana boa?).

O Original, era mistura de português com Negro (de onde veio meu super cabelo-duro!) e minha avó, baiana, de ascendência evidentemente indígena (daí, os olhos puxadinhos que todos herdamos do papai!). Ela era linda! Linda, benzedeira, feminina, sempre de lenço na cabeça e uma gargalhada que fazia tremer o chão da cozinha!

Me lembro desses dois, com muito amor e um pouco de “maquiagem da minha memória”, talvez. Eu fui tão feliz nesse período “meio lá meio cá”, construindo minha identidade “meio caipira” da qual me orgulho tanto, que talvez tenha excluído um detalhe aqui e ali! Lembro do cheiro do pão saindo do forno a lenha, da bicharada sendo frita na panela, dos pés descalços de minha avó e de suas “feitiçarias”. Meu avô ficava mais lá fora, mesmo, cuidando dos bichos vivos, matando coisas que ele considerava condenadas à morte (como cobras e raposas) e somente entrava para comer ou dormir. O restante do dia era na lida, na roça, na Tuia e, no final da tarde, na varanda com seus cigarros e sua cachaça.

Quando estávamos todos lá (eu, meus pais, meus – à época, 3 – irmãos), além de possíveis “anexos” da minha família, essa rotina era interrompida pela nossa barulhenta presença mas, como lugar de homem era pra fora e, de mulher, pra dentro, passei muito tempo nessa cozinha com minha avó, seus pães, queijos e carnes. Era tudo que a gente comia, além, claro, de melancias gigantes, mangas que manchavam minhas roupinhas e toda a frutaiada e coisas verdes de Horta.

Minha mãe a chamava de mãe e lhe devia obediência, portanto, com quatro filhos, sendo três moleques que não paravam quietos nem um segundo, eu “sobrava” para minha avó, o que era um privilégio imenso! Hoje, o vô Lídio, minha avó Maria e meu pai estão juntinhos no céu, partilhando deliciosas lembranças, enquanto eu e minha mãe fazemos o mesmo aqui na Terra.

O Bola era um cachorro. Na verdade, foram vários, todos chamados Bola, ao longo de minha infância. Como a terra do Paraná é muito vermelha, os cães eram todos, meio cor de tijolo. O vô Lídio tinha um jeito todo peculiar de lidar com animais em geral. Por razões dele que JAMAIS questionamos, principalmente porque ele andava com, no mínimo, um revólver e um facão, daquele jeito lento, com botas enormes (com espora de verdade!) e a gente via o “facão cantar” toda hora! Lá vinha o vô: Cigarro na boca, um bicho morto numa mão, o facão ensanguentado na outra e uma longa história, cheia de detalhes de quase morte na captura do animal.

Seu procedimento com os Bolas era sempre o mesmo: Castrava, cortava fora o rabo e as orelhas. Daí, sem rabo, nem bolas, nem orelhas, virava uma “Bola cor de Tijolo” e minha avó (sabe como é baiano…) manteve o nome, já que a aparência do cão era sempre a mesma.

Ela dizia para o cão (do mesmo modo como falava com todos, exceto com o vô Lídio, para quem ela se dirigia muito pouco e em um tom mais “respeitoso”, dizia: “Bola, meu, fi, pegue ali a galinha, a do pescoço pelado, assim, assim…” e, lá ia o tal do Bola, voltava com a galinha “semi-morta” na mão, dava na mão da minha avó, abanava seu não rabo esperando alguma coisa que ela jamais deu e ficava assistindo à cena. Ela pegava a galinha, botava em cima da pia, pegava um facão de cozinha e “zap!” sacava-lhe o pescoço, do ombro pra cima (galinha tem ombro?). Pendurava a bichinha de cabeça pra baixo, em baixo do pescoço (ou ombro?), botava uma bacia pra escorrer o sangue. Desse sangue, fazia uma espécia de “chouriço de galinha”, o restante, ia tudo pra panela! Desde pequena, como pés, pescoço, asas, moelas e, numa família com 5 homens (no mínimo!) uma menina como eu experimenta uma coxa de frango, praticamente, depois dos 12, 13 anos de idade. Eu continuo preferindo pés e asas. A vovó separava essas coisinhas pra mim numa bacia de plástico pequena, dava na minha mão (sem talher nenhum, claro!) e adorava me ver me lambuzando de galinha. Escrever isso me dá água na boca e nos olhos…

Todo mundo trabalhava, inclusive o Bola! Eu aprendi a depenar galinha e passei a fazer esse “serviço”, com uns 5 ou 6 anos. Debulhar milho seco pra galinha, pilhas de milho, é um serviço bem dolorido. Pode parecer inacreditável, mas até descascar amendoim (pilhas e pilhas) machuca demais as mãos. Me lembro de enfiar minhas mãozinhas na água gelada do Paraná pra aliviar essa dor. E, olha, que eu era “café-com-com-leite” nessas atividades. Mais tarde, já com uns 9 ou 10, podia manejar facas e, à exceção da decapitação, todo o restante eu poderia fazer, exceto, claro, também, cozinhar a bichinha, já que a mão da minha avó era o que, realmente, valia.

Meu pai tinha um irmão por parte do vô Lídio com sabe-Deus-quem (eles nunca explicaram essa parte da história mas o que entendemos foi o seguinte: Vovô era viúvo e tinha um menino, vovó era casada e tinha 11 meninos. Meu avô propôs (nos anos 50, no interiorzão de Minas, quase divisa com a Bahia) “Foge comigo, Maria! Larga tudo pra lá! Eu levo meu menino, você escolhe um dos seus e a gente vai-se embora pro Paraná, onde ninguém vai achar a gente!”. Plano perfeito! “Perfeito”, pelo menos, pra mim, porque o menino que ela escolheu foi, exatamente, meu pai. Não era o mais jovem, nem o mais velho, nem o único menino e quando eu, já adulta, tive coragem de perguntar o que ninguém havia perguntado “Por que o meu pai, vó?” Ela respondeu “Ah… era o que tava mais na mão…” e deu sua gargalhada de tremer o chão. Ponto. Eles cresceram assim: O meu pai era dela e o meu tio, dele. Cada um tinha seu filho, “meio juntos”… Na cozinha, meu pai se dava bem e se lascava na roça, meu tio, o contrário.

Se a minha avó cozinhasse uma galinha só, na ausência do meu avô (o que era raro, mas acontecia), as coxas e o peito eram do meu pai e o restante, dividido entre nós. Aquilo não significava nada, nenhum tipo de injustiça ou sofrimento, porque a ordem geral das coisas era totalmente diferente do “normal”. Os homens eram “machos armados” e nós os servíamos.

Meu pai deu uma boa transgredida nessa ordem e, às vezes, somente pra “provar minha macheza” em público, me botava pra montar ou atirar, coisas que ele me ensinou e eu adorava fazer! Montar um cavalo sem cela ou atirar de espingarda, aos 6, 7 anos de idade faz a Disney parecer uma grande piada… No meio do mato, crianças não são “poupadas” de quase nada. Cresci vendo animais sendo abatidos, já beirando a adolescência (aquela chatice, Deus me Livre…) tive uma fase-frescura que não queria comer carne porque tinha dó dos bichos, mas como na minha casa não tinha muito essa de “criança querer”, a frescura passou rapidinho e aquilo era uma coisa “da vida”.

Cachaço é o nome dado ao Porco não castrado, usado para reprodução. Na minha memória, o cachaço (também trocava de cachaço…) era do tamanho de um rinoceronte, uma coisa tenebrosa, da qual a gente não podia nem pensar em chegar perto! Eu entrei muito em chiqueiro, pra pegar os porquinhos bebês no colo e pegar bicho de pé. O bicho de pé é um vermezinho que entra no pé de crianças sem noção que ficam sambando em chiqueiros. Meu micropezinho era um feudo de bichos de pé. Meu avô me pegava no colo, pegava seu facão e, com a pontinha do facão, tirava os bichinhos de mim. Doía muito e eu jurava pra todo mundo que nunca mais entraria no chiqueiro. Mas daí, vinha aquela ninhada… Porquinhos cor-de-rosa, prontos para serem ninados e eu não resistia… Bebê porquinho no colo o dia inteiro, no dia seguinte, lá vinha o vô, com 3 metros de altura “deixa eu ver esse pé!” e sacava seu facão…

Eu comia tudo que via pela frente, queria experimentar: frutas verdes, verduras, direto da horta e até mesmo coisas que não eram de comer, tudo sem lavar… Dias descalça, aprontando… Meu cabelo ia virando um rastafari e eu estava sempre uma imundice. Meu pai brigava com minha mãe “Maria, pelo amor de Deus, dá um banho, penteia, põe uma roupa nessa menina, parecendo um tatu!” e ela dizia “Eu não venço! Ela não pára!”. E voltava pra casa com bicho de pé, vermes na barriga, coisas coladas no cabelo e essas coisas somente apareciam em São Paulo, no Paraná, a gente nem percebia!

E então, um Certo Bola cismou que era porco e começou a frequentar o chiqueiro. Com o tempo, foi ficando com jeito de porco, cara de porco, cheiro de porco, comendo lavagem. Um belo dia, depois de assuntar essa coisa do
Bola ter virado porco, meu avô pegou seu revólver e ia caminhando em direção ao chiqueiro. Eu, não me lembro como, entendi o que iria acontecer: O Bola seria sacrificado e eu tinha que fazer alguma coisa.

Comecei com o “charme com beicinho”, murmurando entre manhas “Vô… não… não… por favor… não mata o Bola… ele é bonzinho!”. Eu era muito pequena mas sabia que raposas matavam galinhas, cobras picavam pessoas e vacas e porcos, a gente comia! Então, todos estes tinham lá “seu bom motivo pra morrer”, mas o Bola! Cachorro não faz mal a ninguém e ele trabalhava, até começar a andar entre os porcos… Era uma fase…

O charme com beicinho sequer ralentou o passo do meu avô e então, tive que tomar uma atitude mais drástica e entrei no “modo Chilique”. Foi um show à parte! Eu comecei a gritar, me joguei no chão, agarrei a perna do meu avô (que me arrastava junto com suas passadas) e mentalizava “Pai! Me ouça! Eu estou quase morrendo!”. Outra técnica que aprendi de menina era gritar de um jeito, com “voz de cabeça” que eu ia ficando roxa, até que, de nossas costas, ouvi a voz do meu pai “Lídio!” – ele nunca chamou meu avô de pai! – e o véio Lídio parou. Meu pai vinha andando com um olhar que quase me fez me arrepender, mas o Bola tinha uma chance!

Estava funcionando! Larguei a perna do meu avô, enchi os pulmões de ar e fui gritando, dramática, roxa, descabelada “Paaaaaaaaaaaaaaaai! Paaaaaaaaaaaaaaai! Nãaaaaaaaaaaaao! Nãaaaaaaaaaaaaao!!!” e ele, desesperado, me botou no colo, ensopada de lágrimas, tremendo de medo – medo de tudo! até de um possível duelo de bang-bang. Seria assim: Meu pai e meu avô virariam as costas um para o outro, contariam dez passos e isto duraria uma eternidade que assistiríamos eu, o Bola e o Cachaço, todos torcendo para o meu pai! “Bang!” meu avô cairia duro e eu traria o Bola comigo para São Paulo. O plano estava todo armado!

Meu pai tinha um jeito de olhar nos olhos de botar muito (mas, muito!) medo – esse, eu também aprendi! – “O que tá acontecendo, Lídio?”. Eu estava no colo, os dois, armados, de chapéu, olhos nos olhos. Era a filha única do filho único da Maria-Baiana-Bruxa-que larga a família. Meu avô estava quase encrencado. Falando tudo meio atropelado, eu em bebenês engasgado de choro e o vô naquele lidiês que só ele entendia, até que meu pai disse “Vai matar o cachorro porra nenhuma, Lídio! Que isso?”. Minha avó, lá da janelinha da cozinha, muito malandra, grita “Deixa de bestage cês dois e vem comer!”.

Assim, em silêncio, voltamos. Enquanto isso, no chiqueiro, Bola e os porcos celebram sua vitória num abraço coletivo.

No dia seguinte, meu avô foi pra Roça e eu passei o dia tentando convencer o Bola a voltar a suas atividades de cão e, para tanto, entrando no chiqueiro, o que também já havia sido proibido. Sentia que estava complicada. Até a última vez que vi meu avô, já com quase 40 anos, todas as vezes que o vi na vida, pedi sua benção e beijei sua mão. Naquele dia, fiz um desenho, fiz coisas de “menina bonitinha”, tentei chantagear minha avó para que ela intervisse, coisa que ela jamais faria, já que “Criação é coisa de homem!” e esperava que ele voltasse de bom humor.

Ele chegou da roça, pedi sua Bênção, puxei seu velho saco (meu avô sempre teve a mesma idade! Ele sempre foi velho, somente diminuiu de tamanho com o tempo) e ele me olhava de esgueia (nesse contexto o “lh” da palavra “esguelha” ficariam absolutamente inadequados!). Não tocou no assunto do Bola, mas eu não resisti.

“Vô, o Senhor não vai matar o Bolinha, vai?” e ele, falando baixo e lentamente me explicou “O Cachaço vai matar ele, fia… Quando as porca entrá no cio, cê vai vê! Eu ia matar ele com um tiro, um tiro só, bem na cabeça, não dói nada, os porco vão judiá dele e a culpa é sua!”. Eu não entendi nada… Pensei “as porca entrar onde? que cio? elas não saem daquele chiqueiro véio!”. E fui perguntar pra minha mãe: “Mãe, onde fica o cio?” (afinal, era só não deixar as porca entrar!) ela “O que?” eu repetia a pergunta e ela repetia o “O que?” até que eu expliquei o que havia me dito o vô Lídio. Ela riu sem jeito e me explicou “é quando elas estão prontas pra ter bebê!”.

Dentro do chiqueiro havia um “quartinho” onde ficavam a porca e seus bebês “Já sei onde é o cio!”. O plano era simples: Era só fechar a porta do quartinho e não deixar que as porcas entrassem… Quando você tem 6 anos de idade, realizar um plano destes exige muito tempo e cuidado. Levei um dia inteiro, entre a busca de uma boa oportunidade, sem testemunhas, desculpas esfarrapadas e muitos “eu te amo, mamãe, eu te amo vovó”, bem bonitinha, pra ninguém desconfiar.

Meu pai, quando passávamos mais tempo no Paraná, claro, ia pra roça como todos os homens e, ao voltar pra casa, deu falta de mim e foi direto ao meu “canto preferido-proibido”. Chega no chiqueiro, está a seguinte cena: Eu lá dentro, pura merda de porco da cabeça aos pés, tapando a porta do quartinho da porca com coisas que eu peguei sem autorização nem fiscalização de nenhum adulto, já escurecendo.

Ele chama meu nome daquele jeito… Tinha um jeito que era, praticamente, “Vem apanhar”. Tinha o grito, meia dúzia de xingamentos (que não passavam de “menina boba” “menina feia” “menina porca”) e o som inesquecível da cinta passando nervosa pelos passantes da calça dele. É, eu iria apanhar, mas era por um bom motivo: As porcas, simplesmente, não entrariam no cio!”. Ele me desceu a cinta, sem dó! Meu avô vinha logo atrás dele (engraçado isso, quando um exagerava, o outro segurava a barra) “Que isso, Joel? Batendo na menina?”. Meu pai apontou a palhaçada que eu tinha feito no chiqueiro e me disse “Você vai arrumar isso agora!”. Meu avô intercedeu “Já está de noite, amanhã a gente vê isso”. Me estendeu a mão (uma mão enorme, áspera de puro calo e rachaduras!) e eu entrei pra casa. Agora era uma coisa coberta de merda de porco, xixi (o meu próprio, já que cintadas sempre estimularam o funcionamento da minha bexiga), descabelada, descaça e quase sobra pra minha mãe. Meu pai, cinta na mão, disse “se essa menina entrar no chiqueiro mais uma vez – balançou a cinta, que sorria de satisfação, sentindo-se uma Naja Venenosa – a gente vai conversar” (com aquele olhar pavoroso que ele fazia).

O clima na mesa estava de cortar com faca! Dois revólveres sobre o guarda-comida. Dois homens putos, duas Marias apavoradas, tudo culpa minha e meus três irmãos me olhando com fúria! Um deles ainda disse pro outro, entre dentes “se fosse a gente, heim!” e eu pensei, meu Deus! Acho que meu pai iria capá-los, cortar as orelhas e o pinto, já que eles não tinham rabo. Fiquei pensando por que é que a gente, que é gente, não tem rabo e concluí, comendo um pé de galinha, que era porque os homens usavam calças e se fizesse um buraco na bunda, pra passar o rabo pra fora, a bunda apareceria, o que era absolutamente proibido.

No dia seguinte, quando o Sol nasceu e os homens foram pra Roça, minha mãe correu concertar a cagada que eu havia feito no chiqueiro e falou comigo, muito sério, que eu não poderia, definitivamente, mais, entrar lá ou ELA tomaria uma surra… Nela, ela batia de mão, mesmo, era feio e esse foi “O” argumento que me convenceu. Adeus chiqueiro.

Nós, quando crianças, desenvolvemos um certo tipo de intuição quando os adultos estão escondendo alguma coisa e esse era o clima da casa. Todo mundo sabia de alguma coisa, menos eu. Meu irmão, o mais jovem dos três, estava com cara de choro, minha mãe também, tinha um silêncio estranho e os homens não estavam na casa, nem na roça (não era dia de roça, não me lembro bem porque). até que eu escapuli e segui meu instinto.

Lá estavam os 4. Meu avô e meu pai dando um jeito na “cena do crime”, o cachaço fumando um cigarro,  ótimo e sem culpa e o corpinho do bola estraçalhado, aos pedaços pelo chão… Minha mãe havia aberto a porta do cio, as porcas entraram lá e o Cachaço matou o Bola, como meu avô havia explicado… Meu pai me olhou de um jeito que dispensou palavras e eu saí correndo.

Minha mãe me pegou no colo pra me consolar. Aquilo, pra mim, era quase como morrer e eu disse “Mãe eu juro, juro, juro que nunca mais vou entrar nem no chiqueiro, nem no cio!”. Ela riu de mim e me abraçou com um amor enorme, como ela me abraça pra me consolar, com aquele peito macio dela, sua voz de Soprano, seu cheirinho. Enxugou as lágrimas que ela continua enxugando, me olhou por um tempo e disse “O que é que eu faço com você, heim?”. E não fez nada, só me amou. Dormi. Esqueci. Dias depois,havia um outro Bola e eu falei pra ele que nem ele nem eu podíamos, nunca mais, que eu havia prometido, entrar no chiqueiro. Muito menos, no cio!

Reflexões de segunda-feira…

1 – IMPARCIALIDADE, OMISSÃO OU COVARDIA?
Quem não está de lado algum, o “imparcial” (ou omisso? ou covarde?) já escolheu um lado que é, sempre, o mais forte e, com grande chance, o errado…

2 – LADRÕES DE GALINHAS

Um ladrão de galinhas rouba as suas por uma única razão: Ele sabe que você poderá adquirir novas galinhas e ele não! Ele precisa revender as galinhas pra levantar um trocado porque tem gastos que você não tem, como (exemplos aleatórios…) garotos de programa, ações judiciais, antidepressivos…


3 – A LÍGIA E A FAXINEIRA
A Lígia (minha amiga Lígia) foi entrevistar uma faxineira e esta começou a dizer “isso eu não faço… aquilo eu não faço” e a Lígia perguntou: “Você toca piano?”. A candidata a faxineira não entendeu e muita gente também não irá entender… O nome disso é “Seleção Natural”. Eu quero a Lígia andando comigo! Só quero as Lígias! Quanto menos Lígias tem no mundo mais eu amo a Lígia! É uma solidão danada! Daquelas que se aprofunda, se intensifica a cada dia… Mas é uma “Solução” (solidão + seleção).


4 – ADMIRAÇÃO E INVEJA
Quando um Profissional admira outro da mesma área, os medíocres entendem esta admiração como “inveja” ou “desejo de estar no lugar do outro” e como este é um Post “espanta-medíocres” quero declarar (pela segunda vez no dia de hoje) meu amor eterno e orgulho e admiração pela Soraia (Zayed) e sua tremenda coragem de fazer SÓ o que e porque quer! A verdade não está paralela à mentira, está acima! Muito acima!

Que atire a primeira pedra!

Seios, beijos, abraços e bumbuns vendem cereal, pasta de dente, cerveja, tudo soltinho, tudo bem à vontade, tem música própria, tem “mulher fruta” e “mulher cachorra” (autodenominada!) de fio dental na TV no horário livre, é “entretenimento”, afinal, “a fila anda”, a mulher é livre, todo mundo nu, é o Brasil da Festa do Cabide!

O Brasil é sensual, a mulher brasileira, então, nem se fale, mas, a mulher brasileira bailarina de dança do ventre na-na-ni-na-não! Tem que ser descente! Distintíssima!

No Flamenco, no Tango, no Moderno aparecem belas pernas inteiras, às vezes até umas calcinhas, tem até nu total! Mas a Dança do Ventre (feminina, trêmula, sinuosa) não, não pode! Já falei! É sagrado! Tem até uma tal de uma Deusa no meio.

E casos de desobediência são punidos severamente exibidos na Net, comentados à exaustão, por meses a fio. “Jade, você viu? APARECEU A CAL-CI-NHA!” (Mas tem que dizê-lo em tom ameaçador, revoltado, com muitos pontos de exclamação). Coisa cansativa essa, não? Enfadonha, preguiçosa.

Tenho vídeos dos anos 50 nos quais aparecem as “terríveis coxas e calcinhas assassinas” e lá no Egito de 1950 podia, no Brasil superbundudo de 2009, não, não pode…

(E essa reflexão me deu uma saudade danada da Dercy Gonçalves!)

dicas

Não sou muito dada a “dicas” mas queria compartilhar uma coisinha com as bailarinas que estão “caminhando” e desejam voar mais alto:

Todas as contratações que tive fora do Brasil vieram de pessoas que me viram no palco, nunca tive contratações por outro caminho, senão este… E, nem sempre foram palcos que eu pisei pensando “Fulano está na platéia!” (exceto uma vezinha, q sabia de uma “determinada presença” e pedi a Deus para que ela estivesse sentadinha quando eu entrasse e Deus me Atendeu, prontamente!). Então, cada vez que for pisar em um palco, pense que, sim “Fulano pode estar vendo” e faça, sempre, o seu melhor! Do aniversário da sua Aluna aos Grandes Festivais, faça o seu Show, pense em você, em ser sempre melhor que você mesma, a cada Show! E seja, sempre, gentil e receptiva com fãs e pessoas que querem te abraçar, tirar fotos, porque estas atitudes “caminham pelo mundo”, mas caminham menos que as contrárias… Uma “propaganda ruim”, dada a “Natureza Humana” sempre chega mais longe! E quando a “propaganda ruim” vier muito “de baixo”, deixe rolar! Propaganda ruim de gente à toa é tão boa o quanto a boa de gente boa! Faça o seu! Tem lugar pra mais gente, sim! Enquanto houver “Divas auto-proclamadas reclamando no Face Book da falta de seilaoquê no Mercado”, significa que ainda cabe mais um! Faça o seu muito bem feito e deixe rolar!!!
A Dança é nossa! Das bailarinas, tanto quanto sempre foi! Porque os “Formadores de Opinião” (‪#‎aiquemedo) estão falando, falando, falando enquanto nós estamos suando, suando, suando… Eles desistem, a gente, não a gente DANÇA!!!!

HAJA RECEITA COM LIMÃO!

Todas vendemos limões. Ponto. A Dança que escolhemos praticar tem 9, 10 passos “Tradicionais” (por falta de palavra melhor…) o resto é tudo “inventol”. Dança do Ventre é e sempre foi OPINIÃO E MODA (não aguento mais afirmar isso ao silêncio! mas, juro, é só isso!) e o que está acontecendo é que, nesse momento, tem uns 100.000 “Neguinhos” vendendo limão e, daí, fica uma discussão sobre “o melhor limão”, por uma razão (q deveria ser muito óbvia!) de Mercado, de Demanda e Procura, é uma conta que não fecha… Tem muita bailarina pra pouco espaço pra dançar, daí, começa uma histeria…


HISTERIA I: O tal do Ballet e sua “brusca entrada na DV”. Mentira… O Ballet sempre esteve entre nós, mas, como é “opinião e moda”, teve um período q virou Moda e todo mundo copiou. Só isso… Pergunto: VOCÊ, bailarina “inconformada” com a possível “evolução da DV”, tá fazendo o que você acha que é Tradicional? Paga suas contas? Sim? Que bom! Não? Que merda… Eu trabalhei na Indústria Fonográfica por 7 anos. Gostava de fazer, exclusivamente, um trabalho, que era Restaurar/Remasterizar/Masterizar CD´s. Bom… o formato CD “quebrou”, eu não me atualizei, não aprendi outras coisas e fiquei “irrelevante no Mercado de Áudio”, perdi meu emprego e fui “procurar minha turma”. O que há de tão “inaceitável” em mudar de idéia? De menina, eu queria ser musicista. Estudei piano clássico por 7 anos (esse 7 vive na minha vida…) e canto e era uma musicista bem medíocre, sinceramente… Daí, diante do risco de ficar em casa, vendo meu piano empoeirar, dando chiliques porque o “jeito de tocar piano não é mais o que eu gosto de fazer” ou ainda “porque eu preciso de um tempo MEU para tocar o que EU gosto”, deixei pra lá… Continuo envolvida com música, fiz, faço aulas, sempre q posso por absoluta paixão, não dependo da “aprovação” de ninguém pra fazer música. Faço o que gosto, quando quero, quando posso. Por que não?
Com a DV, no meu caso, foi o contrário… Eu só queria fazer “alguma coisa com o corpo” e deu no que deu… Não sou EU quem escolhe, é o PÚBLICO!


HISTERIA II: “Ai que saudade de 1940”. Bom… pra esse grupo eu tenho uma péssima notícia: Os anos 40 não voltarão… Desculpe! E vou citar um fulano cujo nome não decorei, um artista plástico que disse na TV “O artista que não é de seu tempo, não é de tempo algum”. Acho uma PUTA SACANAGEM quando me elogiam “porque sou antiga”, sinceramente, isso me ofende, sabia?: “No nosso tempo é que era foda!” MENTIRA! Sempre teve bailarina boa, ruim, média, periguete, louca… só aumentou o número de cada categoria e eu, particularmente, sou muito mais eu hoje do que há 20 anos, em todos os sentidos. Se eu danço bem é porque eu danço bem e não porque “pertenço a uma geração bla bla bla” porque na minha geração (na sua, na sua, na sua e na sua também!) sempre teve as “figuras de hoje” e eu acho injusto (injusto demais!!!) colocar todo mundo que dança há 20 anos na mesma “Categoria” (éramos foda pacaraio) e todo mundo que começou agora, numa outra mesma Categoria que é “magra, siliconada e dança fusão”. As duas afirmações são ABSOLUTA MENTIRA porque eu “estava lá” há 20 e tantos anos e já tinha, SIM, bailarina “gostosa q se dá bem sem dançar grandes coisas” etc… E estou aqui AGORA (Caralho!!!!) e se faço alguma coisa bem hoje, com experiência, junta essa experiência a uma ralação diária e o desejo de fazer bem. Daí há quem diga “Mas você é a Jade, você pode”. Só que é o contrário! Eu só sou “A Jade” porque faço do jeito que faço, porque meu foco foi, é e sempre será o mesmo, mesmíssimo: Cairo, Egito. Ponto.
HISTERIA III: Estética X Qualidade. E, já deixo aqui um desafio: Pra esse bando de gente (sem assunto, sem problemas, sem macho, sei lá…) que fica dizendo que “hoje em dia a menina tem um corpo ‘feito a base de plásticas e silicone’ e é ‘seca’ e fica famosa, trabalha mais que bailarinas maravilhosas que não tem a estética ‘padrão'”. Meu desafio: Me diga UM NOME! Um que seja! Pode ser por inbox, não precisa “se arriscar” (mundinho de merda que todo mundo tem um monte de opinião grosseira sobre tudo e fica nessa baixaria de “indiretas e insinuações veladas”) diga o nome! Melhor! Não contrate, não faça aula com ela, afinal, é só “mais uma gostosa” na DV. Simples, não?


HISTERIA III: Técnica X Sentimento
UMA MOÇA QUALQUER DIZ: “Tipo… meu… assim… eu, tipo, cara, gosto do cara, tá ligado? Só que tipo, meu, ‘hello’… eu quero ver o cara, mas, mano… ‘oi’ depois o eu fico, sei lá… sabe, assim? meio quase q, tipo com uma – como chama… como chama… lembrei! – quase dependencia (sem acento!) do mano que, tipo, cagou pra mim e eu, meu, hello, né?”
DAÍ A CLARICE LISPECTOR DIZ: “Gostaria de poder continuar a vê-lo, sem precisar tão desesperadamente disso!”
O “Sentimento” é o mesmo, a diferença de um e outro discurso, é a “Técnica” (nesse caso, com a Língua Portuguesa, com Gramática, Ortografia). Sentimento sem técnica, só quem aguenta, minha filha, é quem te ama! Ou o FDP do psicanalista q vc paga pra te ouvir dizer seus devaneios.
Vendemos limões! É preciso ter sinceridade com isso, sabe? Ver o seu trabalho, o nosso trabalho, de um modo um pouco mais profissional… Então, se vale aqui um “Toque”, olhe mais pra vc, pra sua história, veja, de verdade, se VOCÊ está oferecendo o tal do “Super limão, delícia, tradicional, com sentimento” que você tanto busca OU administre a dança em você de um modo que seja saudável! Deixa o novo entrar! A verdade tem perna longa, a verdade sempre vence! E, (ISSO É A COISA MAIS IMPORTANTE DESSE POST! TOMARA Q VC TENHA CHEGADO ATÉ AQUI!) meta nessa sua cabecinha que a sociedade não paga NINGUÉM pra fazer o que quer, a sociedade paga as pessoas para fazerem o que ELES precisam, entende? Pagam vc pra fazer o que vc sabe!Entende que não é a manicure que escolhe a cor do esmalte? Entende que não é o padeiro que decide qual é o “melhor pão”? Então, faça o “pão que vende mais” (é um caminho!) ou, faça um pão que SÓ VOCÊ FAZ! (é outro caminho, bom também!) ou vc pode fazer pão (ou vender limão….) pra quem te ama e acha tudo q vc faz lindo e dar um jeito de pagar suas contas com alguma coisa que alguém queira comprar, pode ser?
Limão é tudo limão!

A MULHER MÁ…

A mulher má acorda todas as manhãs e, ao se deparar com sua própria desgraça no espelho (não é uma “desgraça física” é a desgraça de olhar-se nos próprios olhos, de ser ela mesma, sem ter pra onde escapar!) e pensa: “Quem eu vou f… hoje?” Então, revê sua lista de desafetos (sim, ela sempre teve uma lista enorme de ódio ou vingança ou ambos) e começa seu dia…
Envia um email aqui, uma mensagem ali… curte uma coisinha, faz um comentário… derruba umas lagriminhas, conta umas historinhas tristes do seu passado e… “sin-salabin-bin-bin” Voilà! Aconteceu uma grande merda no mercado de DV, na vida de alguém e mais pessoas brigam, desfazem amizades, iniciam intrigas e ela, diante de seu espelho, celebra. Assim atua a mulher má há anos, muitos anos… E, não, ela não quebra, ela não desiste, ela não some, ela não arreda o pé… A mulher má estará, para sempre, entre nós, enquanto houver uma mulher que dance, que brilhe, que faça sucesso para ela tentar destruir.
O que foi que ela me fez? De mim ela tirou contatos profissionais, envenenou amigos (amigos?) e alunos, assedia meus alunos de toda forma que é capaz, em público e eu sempre fico sabendo, me agride privadamente e faz “homenagens tortas” em seu blog… E, para coroar minha “revelação do dia” vou contar um breve história… Em 2010, por razões emocionais ligadas a esta infeliz criatura, tive uma paralisia facial (bem séria que, milagrosamente, desapareceu sem sequelas) e a Mulher má, depois de ter celebrado minha doença entre sua então “Corte”, me enviou a seguinte mensagem: “Se eu pudesse paralisar alguma coisa em você, certamente, não seria só um músculo da face, porque você merece muito mais!”. E uso esta historinha pra ilustrar caso ainda haja gente suficientemente louca para acreditar que há algo “mal entendido entre mim e esta psicopata”. Não, não há. Ela é uma pessoa que adoeceu profundamente e vive para suas armações, maldades, assédios morais e ações judiciais e eu sou uma bailarina árabe que está tentando fazer seu trabalho.
Isto é uma “provocação” à mulher má? E eu, lá, sou doida? Claro que não! Isto é uma resposta. A cada vez que ela me fizer uma maldade (ainda que seja uma maldadezinha) eu venho aqui contar uma historinha dela pra vocês! Tem outras! Tem umas bem boas! Poucas coisas me assombram nessa vida e esta mulher má é a própria personificação da sombra…
Passei 5 anos “no salto” enquanto ela se refestelava pelo Brasil (e pelo mundo!) com meu nome, não quis me rebaixar, mas… a nobreza é um idioma que não se fala sozinho.
to be continued…. for sure!

Ouvi dizer que…

Ouvi dizer que, quando um artista vai para o palco, ele leva consigo o que aprendeu na vida e não em sala de aula… Mas, o que você passou, não é tão importante ou pessoal assim, eu, sua mãe e minha mãe, e a Rainha da Inglaterra e a moça que vende coxinha também passamos. O que interessa mesmo é o que a gente fez com o que a gente passou.

Nossas dores, amores, mágoas, decepções, medos, fez o que deles? Virou muleta? Amuleto? Esconderijo? Psicopatia? Pode ser também, mas também dá pra metabolizar isso… A arte é um caminho, a dança, então… Que caminho!

Peguei uma dor aqui, um amor ali… umedeci com lágrimas, gozo, saliva, até que ficasse molinho, que virasse onda, oito, círculo e vou lá, na frente de todo mundo, derreter os meus sentires… Decantei a raiva (e quanta raiva!) até que ficasse seco demais, tenso demais, pra tremer a raiva, não tremer de raiva porque não tenho tempo, preciso sorrir e preciso sorrir agora! A vida é urgente! “É importante viver o hoje” é uma bobagem enorme, porque insinua que tem outra forma de viver que não seja o hoje e não tem, não. Ou tem?

Então eu vou dançar o que eu sinto e me recuso a guardar essas coisas em diários. Eu quero mais é que todo mundo veja! Que goste, que odeie, que tema, o que for, mas não existe descoberta pessoal! Olha pra essa palavra “descoberta”. Tá descoberto, pronto, já foi e agora, pertence a todos nós!

(Jade El Jabel – julho de 2011)

Para onde vai o Mercado de Dança do Ventre

Aí está uma pergunta cujas respostas estão se formando bem diante dos nossos olhos. Antigamente, uma cantora, para ser “uma Madonna”, precisava de uma Grande Gravadora, hoje em dia, uma artista como a Madonna tem seu próprio selo, administrado por ela mesma, total liberdade, assim como administra sua carreira e escolhe os rumos que irá tomar. Assim também, é boa parte dos Artistas Plásticos da Atualidade, trabalham em casa, em pequenos Ateliers, em cooperativa com outros artistas da área e, muitas vezes, entregam o “produto”, diretamente na mão do consumidor, sem passar pelas Grandes Galerias que, no passado, eram imprescindíveis para o sucesso de sua carreira. O Mercado de Dança do Ventre “Oficial” existe há, no máximo, 20 anos, é um bebê, comparado à música e às Artes Plásticas (não como arte, sim como mercado) e, como as outras artes, não passará toda a eternidade “Underground” como foi, durante quase todos estes anos. À medida que a Dança do Ventre move mais gente e, conseqüentemente, mais cifras, pouco a pouco, se insere no mercado de arte Global e não continuaremos onde estamos, neste “Lugar Especial”, separadamente das outras artes. Alguns Produtores, munidos de boa vontade (e dinheiro, claro) globalizaram o Mercado – no Brasil, na Europa, no Egito – trazendo/levando/apresentando artistas de várias partes do mundo e, hoje em dia, pode-se dizer que “praticamente todo mundo se conhece”. Os grandes produtores foram fundamentais para este processo de “popularização” da Dança do Ventre. E foram, também, incumbidas da função de informar ao público o que deveria ou não ser referência, tudo isto, sem muita consciência ou intenção. Hoje, já não tem funcionado mais assim, já que alguma criatura incrível criou o Youtube e outra, mais incrível ainda, o Goolge e você pode, dentro da sua casa, escolher o que ver sem jamais ter visto a bailarina em um único “grande cartaz” e muitas vezes, sem querer “esbarra” com uma artista e, simplesmente, se apaixona. Em seguida, à medida que os Festivais foram crescendo pelo mundo, a escolha dos artistas para estar em um evento era baseada no evento que este artista poderia vir a produzir em sua localidade (Estado, no Brasil, País, na Europa) e, a partir deste momento, a norma passou a ser “me leva que eu te trago”. Entretanto, esta “política” está ficando cada vez mais desgastada. Um dos comentários que tenho ouvido por aqui é “Muda o evento e o cartaz continua o mesmo” e, assim, algumas professoras e bailarinas que também produzem, acabam perdendo credibilidade no seguinte sentido: “Minha professora – mestra, predileta, ídolo, etc – não escolhe outras professoras baseada na qualidade e sim, em quem irá convidá-la para seu próximo evento”. Deu errado. É uma política que está muito perto do fim. O contrário, aqui na Europa, funciona da seguinte maneira: As alunas/bailarinas que têm interesse em uma determinada bailarina/professora se organizam e contratam a bailarina para o “Job”. Muitas vezes o “Job” consiste em Workshops, Aulas Particulares e Shows. Quase sempre, trabalham para 80, 100 pessoas e não 800, 1000, como vinha acontecendo. As redes sociais aproximaram os artistas do público, portanto, “qualquer um” hoje em dia, pode contatar um artista, diretamente, pedir um orçamento, fazer contas e descobrir, inclusive, que seu dinheiro estava sendo investido em sabe-se lá qual bolso, já que os artistas não estão acendendo charutos com notas de cem (ou estão?). Como foi que algumas grandes gravadoras sobreviveram à nova ordem? Selecionando e pagando melhor os artistas e (esta é a melhor parte!): prestando mais atenção ao desejo dos consumidores de música. O que, penso eu, já está acontecendo, também, no Mercado de Dança do Ventre. Eu produzo pequenos eventos no Brasil, sempre na casa dos 200 convidados, sempre lotados até a última cadeira e já convidei artistas que jamais me convidaram para nada (e convidaria novamente!) e o contrário também. Furei a fila do “Me leva que eu te trago”, e furei várias vezes! Pisei em boa parte dos maiores palcos do Mundo, sem ter, jamais feito uso de nenhuma estratégia política e/ou pago para dançar (que também é uma política em uso há muitos anos no Brasil e no Mundo) e este ano, ministrarei aulas no Ahlan Wa Sahlan no Cairo, onde tantas pessoas já haviam dito que “só funciona na politicagem”, fui convidada pela própria Mm. Raqia Hassan, estou em Turnê na Europa, 8 cidades, todas, sem exceção, produções pequenas, de artistas que admiram meu trabalho, furei a fila de novo, portanto, dá. Entre os artistas que me contataram, houve também os contatos do tipo “Jade, estou muito interessada em seu Mercado, quero dizer, no seu Trabalho, se você me levar para o Brasil…” ao que eu respondi que sinto muito – não por não gostar do trabalho da menina, por outras três razões, a primeira, que eu não produzo eventos para bailarinas de fora da minha Companhia, a segunda, por não acreditar no formato e a terceira porque eu sempre soube que isso – também – iria passar. Eu gosto muito de pensar por esta perspectiva, que as coisas passam, até porque não sou nada saudosista, nunca fui! Não tenho a menor saudade do Cinturão de Franjão de canutilhos, porque já usamos, já vimos, já passou. O início do mercado em São Paulo e o que fazíamos há 15, 18 anos era muito bonito e cheio de paixão, mas os anos não voltam e, sendo assim, melhor olhar para frente, como qualquer profissional e as bailarinas que, neste momento, estão “ralando” na frente do espelho – que é onde todas deveriam estar – é o que eu quero ver no palco nos próximos anos! Com ou sem cinturão, ou tradição, ou fusão, ou seja lá qual for o “ão” do ano. E, quando chegar a hora de eu estar na platéia e não na coxia, eu prometo a vocês que não vou dizer “no meu tempo é que era bom” porque o meu tempo é agora, o seu também, e amanhã será nosso também, um outro tempo, outras formas e a única coisa que não muda nunca é que o mercado pertencerá a quem sempre pertenceu: Às grandes bailarinas de Dança do Ventre que fazem seu trabalho com amor e profissionalismo. Todo o resto é momento e o momento sempre passa.

(Jade El Jabel – 2012)

“VENTREVEST”

Um grupo de 10 vestibulandos sentam-se à mesa do bar e fazem um Campeonato de Adivinhação da Tabela Periódica, definindo que o último a acertar paga a conta. A brincadeira dura apenas poucos minutos, pois todos os 10 a sabem de cor. Dá empate técnico, 4 deles demoram o mesmo tempo para lembrar a tabela toda e, portanto, devem pagar a conta. A conta chega: $ 160,00 a serem divididos pelos 4 perdedores e um deles pergunta: – Alguém tem uma calculadora?

É claro que estou aqui para falar de Dança do Ventre e contei esta historinha hipotética para fazer um paralelo com o que pretendo colocar: A atual Dança do Ventre (há exceções, sempre há, muitas, Graças a Deus!) está numa fase “Dança pré-vestibulanda”, onde decoram-se fórmulas e esquecem-se coisas simples, entretanto, fundamentais para o dia a dia de uma bailarina, como divisão (por 4!) na vida de qualquer criatura.

A menina entra para dançar: Linda, bem vestida, com um figurino “recomendado” de Costureira X ou Y, a custo de “Costureira da Moda” ou ainda (pior!) “Condição para ser aceita”. Cabelo e maquiagem impecáveis, sorriso aberto, corpo “dentro dos padrões definidos por sei lá quem”. Tudo que disseram que ela deveria fazer para ser aceita.

Entra no momento certo da música, com muito impacto, gira, sorri, ocupa todo o espaço com uma meia ponta de deixar qualquer Fifi Abdo de queixo caído e então lá vem ele… um violino! Um violino é um instrumento arredondado, pequeno, acinturado, que é tocado coladinho ao corpo, às vezes de olhos fechados o que, traduzindo para “Dançadoventrês”, pede (ou exige?) oitos, redondos, ondulações, movimentos cheios de sinuosidade, sensualidade, poesia e a “Candidata” (ui!) faz… braços! Molduras pré-aprovadas, perfeitas, organizadas. Então, surge um Qanoon, desenhando ondas trêmulas no ar, trêmulos pequeninos, irregulares, que sobem, descem, desaparecem e ressurgem de longas pausas de delicioso silêncio e a candidata… gira, gira, faz cambrés, arabesques, tudo muito lindo, muito limpo e… absolutamente fora do lugar.

Daí “tenque”… Tem que fazer uma cara assim, outra assado, olhar para todos os examinadores, sorrir, agradar, agradecer, seguir as regras, as fórmulas, os Guias… Tem que pular loucamente à simples menção de um Mizmar, porque daí é Saaid, tem que “bater cabeça”, numa simples menção de um “Soud”, porque daí, é Khaligie.

Um rítimo “incidental” é uma citação dentro de uma composição e não uma regra para a bailarina e, na minha opinião, o que quer que ela faça com graça, beleza, verdade e prazer, dentro do tempo, com bom gosto, sim, está certo!

Pergunte em uma sala com 30 brasileiros:

– Qual a diferença de Baião e Xaxado?

– De que região do Brasil vem a Catira?

– Qual é a diferença entre Aboio e Repente?

– O que é síncope?

Destas perguntas depende, um sujeito que se julga “músico brasileiro competente” sê-lo de fato, assim como apreciadores da música brasileira.

Depois que constatarmos que não sabemos, sequer o “mínimo” sobre a nossa própria música, podemos voltar a falar sobre ritmo e composição, mas já me adianto: É de uma prepotência sem precedentes acreditarmos que aqui, do outro lado do Planeta, podemos julgar com absoluta certeza, se um ritmo incidental é um Soud, Aiub, Núbio que têm, entre si a diferença de um Baião e um Xaxado (ambos, nós, ignorantes da música brasileira chamamos de “Forró”, que é, também, uma outra coisa, vem de “For all” – “para todos” em inglês – e trata-se da Festa, é um evento, é uma “Festa for all”.

Informação balsâmica para a sua cara de “?”. Dança do Ventre também é for all!!!

Uma dança com figurino e música árabes que não tem oitos, ondulações, redondos e shimmies é Fusão (ou “Fusion”, como a maioria prefere chamar), não é certo nem errado mas “do Ventre”, sem trabalho de Ventre, não, não é.

Como foi mesmo que isso aconteceu com a gente? Por onde e por que começou? Eu palpito que foram dois eventos paralelos aos “Concursos de Dança do Ventre”:

1 – A Dança do Ventre é difícil, mesmo, demora, às vezes dez anos para estar, realmente, Oriental, então começamos a “comê-la pelas rebarbas”, ensinando braços para a dança, ballet para a dança, leitura musical para a dança, coisas. Coisas em volta da dança.

2 – Fazer aula regular anda meio fora de moda… A menina vem para uma turma ou aula particular e eu pergunto “Quanto tempo de aula você tem?” e, depois de muita enrolação para responder, percebo que ela faz “Workshops de Dança do Ventre há X anos” e aulas particulares com o País inteiro para ser conhecida por bailarinas importantes o que irá, certamente (?), ajudá-la a “Passar no Ventrevest” de sei lá quem.

O tempo médio de Graduação em uma Universidade “quase impossível de entrar” varia de 6 a 10 anos. Ninguém ensinou o que fazer depois de “estar lá”, só aprendemos a “estar”, não aprendemos a ser, nem a aprender, nem a permanecer porque fórmulas servem apenas para isto. Estar. O ser é uma construção pessoal, ser profissional, então, uma outra construção que depende de um pouco de talento e muito esforço, então vem a frustração e a menina bate na minha porta uma vez mais “Eu fiz tudo direitinho! Tenho um guarda-roupa incrível, conheço todas as pessoas que deveria conhecer, fiz os cursos que tinha que fazer e ‘não aconteceu nada’!” e então, me resta a terrível função de comunicar a menina que para ser Bailarina de Dança do Ventre ela precisa aprender a dançar Dança do Ventre e, sim, estas coisas óbvias são as que devem ser repetidas porque são as que esquecemos primeiro, buscando a tal da fórmula que em tantos anos de apaixonado exercício de ensinar Dança do Ventre (17!!!) não há diabo que faça a menina convencer-se disso, por mais que eu diga.

Encerrados os meus argumentos, a contra-argumentação é quase sempre a mesma: “Você é a Jade, você pode se dar ao luxo de fazer o que quiser!”, lá vem mais uma informação-bálsamo: É o contrário, Bailarina!!! É justamente o contrário: Foi somente por fazer o que quero – e estudo, e acredito, seguindo o exemplo de algumas das maiores bailarinas do mundo – que eu cheguei até aqui.

Vai pro espelho, Bailarina! Pegue esse tempo de discussão de fórmulas, tome um banho bem gostoso, cuide da sua pele, faça muito carinho em você mesma, coloque uma roupa confortável, faça um chá de frutas vermelhas e vai ver a Fifi Abdo dançar…

É pra você, pra mim, pra Fifi, é for all!