No começo foi assim

Quando a gente tem 20 anos, saindo da adolescência, se sente ficando velho pela primeira vez. Eu senti. Depois de novo aos quase 30, depois com uns trinta e cinco e, por incrível que possa parecer, passa. E esse sentimento, esta sensação de urgência, muitas vezes é o que nos move. Foi assim que comecei a dançar. Porque “já estava” com 21 anos e precisava fazer alguma coisa para cuidar do corpo. E foi neste exato momento que encontrei uma amiga minha tinha ido à Khan El Khalili (Casa de Chá, em São Paulo) e, numa conversa sobre isso, sobre estarmos precisando ter um carro, um emprego, um namoro sério que surgiu essa questão de cuidar do corpo. E ela disse “Jade, eu achei esse lugar a sua cara!.. Eu vi que lá tem aula de Dança do Ventre!” e me deu um cartão.

Eu tinha acabado de arrumar um “bom emprego” e folgava às quintas. Na minha primeira folga, com o cartãozinho na mão fui até lá.

Tinha uma aula que começava às duas e eu podia experimentar! Como eu era meio “hippie”, a roupa que estava usando (saia comprida e blusinha) era adequada para a aula.

Entrei pela primeira vez no Harém da Khan El Khalili e fiquei aguardando a professora.

A professora: Layla. Treze tatuagens no corpo, cabelo vermelho merthiolate, blusa de onça, micro saia e cuturno. Olhos grandes e verdes e voz de veludo.

Me lembro, claro como se fosse hoje, da primeira música que ouvi. Era “Wa eh yanni”, do Omar Diab. Era a música do aquecimento.

Na minha turma, mulheres exóticas, tipos que eu nunca tinha visto fora da TV, na distante periferia onde nasci e fui criada, na Zona Leste de São Paulo.

O cheiro de insenso, a Layla, aquela música… Parecia um sonho e, ao mesmo tempo, uma coisa que sempre havia estado em minha vida, uma confortável e inédita sensação de “pertencimento” de estar em um lugar que era adequado pra mim, que combinava com as minhas roupas, com o meu cabelo, com as coisas que eu julgava belas. Eu não sabia o nome daquilo, mas era o “Mundo Árabe” entrando de maneira sutil e definitiva na minha vida.

Naquele dia comprei fitas K7 (Henkesh, Omar Diab, George Abdo e Najua Karam). Ao chegar, antes de entrar em casa (embaixo de casa era a Imobiliária do meu pai) pedi para o meu pai comprar um espelho pra mim! Subi com o espelho na mão “Mãe, me ajuda aqui!” afastei uns móveis, botei o espelho na parede, um tapete no chão e nunca mais saí de lá.

Não tinha nenhuma intenção de me profissionalizar, sequer pensava nisso, mas a dança me dava muito prazer, vi naquele espelho uma beleza que eu não tinha visto antes.

A Layla me disse, lá pela terceira ou quarta aula: “Você será uma bailarina brilhante! Queira ou não, é uma coisa que tá em você, na sua vida! Você tem que estudar bailarinas egípcias, seu estilo é egípcio e não tem nada a ver com o que a gente faz aqui!” Eu não sei bem se acreditei ou não, sinceramente mas sou um tipo de aluna que, se eu confio na professora eu faço o que ela manda e ponto. Me levou na casa da Samira (Samia) e no Omar (Naboulsi) e comprei vídeos pra estudar: Fifi Abdo, Mona Saaid e alguns vídeos que eram “moda” na época.

Estudava todos os dias, ainda estudo muito. Porque gosto, mais do que porque preciso, estudo tudo que posso, arte, idiomas, política, esculpo, pinto, escrevo, porque gosto. E vou dizer exatamente o que foi que aconteceu: De tanto me dedicar aprendi e, de aprender meu telefone começou a tocar. E, 19 anos depois estou aqui, contando essa história absolutamente real.

A Garota da Capa

E então a Rhazi me ligou e disse “Quer ser capa da Shimmie?” e eu, no primeiro suspiro durante o processo todo fiz minha primeira descoberta: Não, não sabemos o que queremos, não! Porque eu fiquei numa felicidade tão imensa e era uma coisa que eu, simplesmente, não havia reparado: Sim! Eu queria ser capa da Shimmie!!!

E vieram as Celebrações! Na sexta-feira, 7 de junho pp, no Núcleo Ju Marconato em Araraquara. A Ju é linda e dança Dança do Ventre muito bem. Então, nos perguntamos “tá, o que mais?” e, tendo visto o nascimento de algumas estrelas, me pergunto sempre o que mais e a resposta é uma só: Autenticidade. Quando um artista faz o que acredita (porque leu, inventou, decidiu, aprendeu, não importa!) a coisa vai! Mas tem que ser de verdade! Crer numa coisa é uma atitude com relação à coisa e não um sentimento! A Bíblia diz que a fé sem obras é vã e a fé sem preces é vã! Crer, até mesmo em Deus que ouve seu coração é uma coisa que tem que te levar em algum lugar! Assim, a menina que “acredita numa coisa”, vai nela à fundo e eu não estou falando nem do Google nem de PNL! Estou falando de ralação, de investimento de tempo e dinheiro, de horas sem TV. Autenticidade com investimento alto! Aí vai!

Certa vez, uma menina veio fazer uma aula particular comigo e disse “Meu ‘problema’ é a Fulana! Na minha cidade, só querem saber da Fulana! O estilo da Fulana bla bla bla…”. Depois de deixá-la desabafar, olhei para o relógio e disse “Olha, ela nunca foi minha aluna, mas se estivesse aqui, eu apostaria minha perna direita como não estaria falando de você há 20 minutos!”. E essa foi a primeira vez que eu ouvi o nome “Juliana Marconato”. E uma única noite com ela me fez entender o que essa moça tem “de mais”.

Muitos beijos, abraços, declarações de amor, em um lugar belíssimo, com comidinhas quentinhas e cerveja gelada! Sorrisos e gentilezas aos montes, entre todos nós. Simplesmente, perfeito! Impecável e de bom gosto!

E, já que eu estava assim, tão “em alta”, decidi me arriscar um pouquinho, só pra dar uma “Reclimada” no meu modo Garota da Capa e, aproveitando o lançamento da Revista no meu estúdio, fiz um Vernissage pela primeira vez, apresentando gravuras, telas e esculturas, que produzo desde 2001 e nunca havia exposto! Acho que eu precisava que gostassem de mim de outro jeito e queria correr o risco de não gostarem! Lição 2? Ai, como eu queria que gostassem!!! Vinho, música, frutas secas, meus melhores amigos, alunas, convidados muito mais que VIP´s (daqueles que não vão a parte alguma!) e (ufa!) eles gostaram!

Gostaram tanto que, além de elogios e delicadezas no Livro de Visitas, vendi duas telas! Primeira colherada de sucesso nas Artes Plásticas! Sucesso é quando querem comprar uma ideia sua! Para minha sorte, ambas foram adquiridas por amigas muito queridas e foi um grande alívio saber onde elas vão morar!

Domingo, 9 Noites no Harém, no Sagrado Harém da Khan El Khalili! O Jorge (Sabongi) me recebe de braços abertos, olhos azuis arregalados e um sorriso que recheava a cara: “Jadiskão! (pois é… ele me chama assim!) E aí, Superstar?!” e me dá aquele (aquele!) abraço! Adorou minha entrevista, adorou a foto de capa, diz que dá vontade de ler mais, diz “o volume 001 do seu livro é do Habibi!” e eu penso (Lição 3 a caminho!) “É… é a aprovação do Jorge… é legal, né…” (rs…).

E tudo isso, desde a porta da minha casa a caminho de Araraquara, na companhia das gatinhas da Shimmie Rhazi, Dani e Josi e este é um parágrafo à parte! Que delícia! Que deleite! Mulheres inteligentes, cheias de humor e de estilo, educadas, discretas, um arraso! Do telefonema da Rhazi ao abraço de despedida das meninas no Jardim da Khan El Khalili foi, literalmente, só alegria! E uma alegria que não é pra “quebrar o galho”, uma intimidade que não é pra “troca de favores”, são coisas espontâneas, naturais, que brotam entre pessoas que têm espaço para receber, desejo de doar, é um bálsamo nesse mundo oco em que vivemos agora! E me lembrei de uma coisa fácil de deixar de lado, mas, sem a qual esse mundo se torna insuportável: As pessoas são boas! A maioria delas é, sim!

E, ao contrário do que poderia parecer, o último final de semana, para mim, foi uma lição de humildade! Descobri que todas (ou quase todas) nós quer, exatamente, as mesmas coisas, todo mundo quer ser amado, aprovado, viver cercado de pessoas boas e todo menina quer, um dia, ser a Garota da Capa!